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FERNANDO JÚNIOR

Retrospectiva 2021 do Direito Imobiliário

Artigo escrito por André Abelha*




Revista Consultor Jurídico, 13/dezembro/2021


Uma importante coletânea sobre os avanços e os desafios que marcaram o ano 2021 no Direito Imobiliário, elaborada pelo Presidente do IBRADIM, Dr. André Abelha:

DESPEJOS e DESOCUPAÇÕES

O STF, na ADPF 828, suspendeu, até 31/3/2022: 1) a remoção forçada coletiva de imóvel privado ou público que sirva de moradia ou que represente área produtiva, se decorrente de decisão proferida após 20/03/2020; e 2) despejos liminares nas locações, desde que o locatário demonstre, em razão da pandemia, a incapacidade de pagamento sem prejuízo da subsistência familiar. Sublinhe-se que a suspensão dos despejos: 1) somente se aplica às locações residenciais com aluguel de até R$ 600 e às locações não residenciais de até R$ 1,2 mil; e 2) não abrange liminares em locação para temporada, em razão da morte do locatário ou para reparações urgentes determinadas pelo poder público. Isto é, muitos casos estão fora da abrangência da lei e da decisão, sendo necessário analisar cada hipótese, sem generalização.

CLÁUSULA RESOLUTIVA EXPRESSA e REINTEGRAÇÃO DE POSSE

O STJ decidiu ser "possível o manejo de ação possessória, fundada em cláusula resolutiva expressa, decorrente de inadimplemento contratual do promitente comprador, sendo desnecessário o ajuizamento de ação para resolução do contrato" (REsp 1.789.863-MS).

TAXA DE MANUTENÇÃO DE LOTEAMENTO

A obrigação de contribuir para as despesas de manutenção do loteamento urbano cobrada por associação de moradores, prevista no contrato-padrão registrado no cartório de imóveis, surge somente a partir da aquisição do lote ou da casa, não abrangendo os débitos do anterior proprietário. Além disso, o Ministério Público possui legitimidade para defender grupo de titulares de lotes ou de casas. É o que foi decidido pelo STJ nos REsps 1.585.794-MG e 1.941.005-SP.

SISTEMA DE GARANTIAS

O governo federal lançou o projeto de lei que dispõe sobre o aprimoramento das regras de garantias e outros assuntos. A medida, se aprovada no Congresso, terá impacto sobre o mercado imobiliário, com a flexibilização do uso das garantias e barateamento do crédito. Segundo o Ministério da Economia, as novas regras poderão movimentar até R$ 10 trilhões no crédito imobiliário. O PL prevê, entre outros: 1) a criação do serviço de gestão especializada de garantias, para facilitar o compartilhamento de garantias nas operações de crédito e de financiamento; 2) que as garantias assegurarão todas as operações autorizadas pelo garantidor, e que o inadimplemento de quaisquer das operações possibilitará à gestora de garantia considerar vencidas antecipadamente as demais operações vinculadas às garantias; 3) que um único imóvel poderá ser alienado fiduciariamente mais de uma vez, de modo superveniente, ficando a eficácia da segunda garantia condicionada ao pagamento do primeiro crédito; 4) a execução extrajudicial dos créditos garantidos por hipoteca e da garantia imobiliária em caso de concurso de credores; e 5) a alteração do Código Civil (artigo 853-A) para prever a figura do agente de garantia, designado pelos credores das obrigações garantidas, que terá dever fiduciário e atuará em nome próprio e em benefício dos credores.

LOCAÇÕES DE CURTA TEMPORADA

A 3ª Turma do STJ, no REsp 1.884.483, por unanimidade, seguindo a mesma linha da 4ª Turma (REsp 1.819.075, julgado em abril), decidiu que o condomínio residencial pode proibir, a priori, locações de curta temporada via aplicativos como o AirBnb. O argumento central é que tal modalidade desnaturaria a destinação residencial, com violação ao artigo 1.351 do Código Civil (CC), que exige unanimidade dos condôminos para a alteração. As decisões ainda deixam questões no ar: 1) e se a locação de curta temporada for ajustada sem o uso de plataforma virtual?; 2) se o pano de fundo é o incômodo causado por tais locações, a proibição será lícita mesmo quando o condômino-locador não causar incômodo, insegurança, risco à saúde, nem violar os bons costumes?; 3) se o problema é a violação ao artigo 1.351 do CC (e também à parte inicial do artigo 1.336, IV), por que a proibição dependeria de deliberação de dois terços dos condôminos?; 4) essa possibilidade se aplica a condomínios situados em áreas com vocação turística? Condomínio de casas deve ser visto de forma diferente? E os loteamentos de acesso controlado?; 5) e se tal locação já era costumeira no condomínio?; e 6) quais serão os critérios para se averiguar eventual abuso do direito de proibir (CC, artigo 187)?

REGISTRO DE IMÓVEIS: Saec e TOKENIZAÇÃO

O Sistema Eletrônico de Registro de Imóveis (SREI) tem, entre outros, o objetivo de viabilizar a instituição do sistema de registro eletrônico de imóveis previsto no artigo 37 da Lei 11.977/09, melhorando a segurança da informação, interconectando os cartórios e garantindo a continuidade dos serviços registrais em elevado padrão técnico. O SREI é integrado pelos oficiais de registro de imóveis de cada Estado e do DF; pelo Serviço de Atendimento Eletrônico Compartilhado (Saec), de âmbito nacional; e pelas centrais eletrônicas, todos coordenados pelo ONR, o operador nacional do SREI. Em setembro, mais um passo importantíssimo foi dado: após um trabalho colossal e relevantíssimo dos envolvidos no projeto, o Saec foi oficialmente lançado. Outro fato digno de nota é a edição do Provimento CGJ/TJ-RS nº 038/2021, que regulamenta a lavratura de escrituras públicas de permuta de bens imóveis com contrapartida de tokens ou criptoativos e o respectivo registro imobiliário pelos cartórios do RS, levantando importante discussão sobre a tokenização imobiliária.

IMÓVEIS DA UNIÃO

O Programa SPU+ tem o objetivo de inovar, modernizar e transformar a gestão e governança do patrimônio imobiliário da União, e para tanto foi dividido em três módulos: (a) alienação: ações para incremento da venda de imóveis, doação, regularização fundiária e remição de foro; (b) racionalização: aplicação da engenharia patrimonial no uso dos imóveis da administração pública (permutas, adequação do espaço, dentre outras ações); e (c) cessão e concessão: ampliação das cessões onerosas e em condições especiais e as cessões de direito real de uso onerosas e gratuitas. Muita coisa boa pode surgir daí, e o mercado imobiliário precisa aproveitar a oportunidade. Mas não nos iludamos com manchetes sensacionalistas caça-cliques. Não haverá "o fim do laudêmio". Ou então precisamos anunciar "o fim do aluguel" por causa do direito de preferência.

PROGRAMAS DE REQUALIFICAÇÃO URBANA

Para tentar reverter a tendência de degeneração local, a Prefeitura do Rio de Janeiro lançou o Programa Reviver Centro (Lei Complementar nº 229/2021), com o objetivo macro de atrair novos moradores e promover a recuperação urbanística, social e econômica da região. Além de prever incentivos fiscais, o programa estimula a locação social, a construção de novas moradias e a conversão do uso de prédios comerciais para transformá-los, após reforma, em edifícios de uso residencial ou misto. Na mesma linha, o prefeito de São Paulo sancionou a Lei municipal nº 17.577/2021, que trata do Programa Requalifica Centro, que também prevê incentivos a fim de atrair investimentos para a região. Essas leis estimulam projetos de retrofit e conversão de uso dos edifícios, e o desafio será superar, nos condomínios pulverizados, a exigência de unanimidade prevista na legislação civil.

IMÓVEIS RURAIS

A Receita Federal do Brasil publicou a IN nº 2.030/2021, que institui o Cadastro Imobiliário Brasileiro (CIB), que integrará o Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais (Sinter). O CIB, a ser administrado pela Receita Federal, terá como ousada meta centralizar informações cadastrais de todos os imóveis do Brasil, rurais e urbanos. Para os imóveis rurais, o CIB substituirá o Nirf, e até junho de 2022 o CIB poderá, excepcionalmente, ser emitido para áreas sem localização georreferenciada. Se der certo, o CIB, ao lado do SREI, poderá representar mais um passo importantíssimo na revolução cadastral imobiliária em curso no país.

FIADOR NA LOCAÇÃO NÃO RESIDENCIAL

Está empatado em 4 a 4 o julgamento do RE 1307334, em que se discute a possibilidade de penhora de bem de família do fiador de contrato de locação não residencial. Pela possibilidade de penhora os ministros Alexandre de Moraes, Luis Roberto Barroso, Nunes Marques e Dias Toffoli. Pela proteção do bem de família os ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Carmén Lúcia e Ricardo Lewandowski. O mercado acompanha preocupado a conclusão do julgamento, que foi suspenso em agosto.

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA e CONSUMIDOR

O STJ afetou o Tema 1.095 para "definição da tese alusiva à prevalência, ou não, do Código de Defesa do Consumidor na hipótese de resolução do contrato de compra e venda de bem imóvel com cláusula de alienação fiduciária em garantia", com determinação de suspensão do processamento de todos os feitos e recursos pendentes que versem sobre idêntica questão, nos termos do artigo 1.037, II, do CPC/2015.

ASSEMBLEIAS CONDOMINIAIS VIRTUAIS

Foram aprovados na CCJ da Câmara dos Deputados o PL 548/2019 e seus apensos. O PL 548 acresce ao Código Civil o artigo 1.353-A para autorizar as assembleias condominiais virtuais "desde que não haja quórum nas convocações presenciais, que tal possibilidade tenha sido aventada quando da convocação da assembleia e que seja garantida participação de todos os condôminos". Se o atual texto passar pelo plenário, e então pelo Senado, com promulgação sem vetos, será mais um exemplo de lei que vem para dizer o óbvio. Estamos culturalmente condicionados a achar que só podemos fazer o que a lei permite, quando na vida privada é justamente o oposto: temos autonomia e liberdade para fazer tudo o que não viole a legislação em vigor e o direito alheio.

LICITAÇÕES

A nova Lei de Licitações (14.133/21), invade, como a anterior, o Direito Imobiliário. Eis o que consta de principal no tocante a bens imóveis: 1) definições de obra, de serviço comum de engenharia, de leilão e de investidura; 2) edital do leilão (descrição); 3) necessidade de licitação, avaliação, justificativa e autorização legislativa (e hipóteses de inexigibilidade, dispensa e direito de preferência) para fins de locação, alienação, doação com encargo e concessão de título de propriedade ou de direito real de uso de imóveis urbanos e rurais; 4) imposição de escritura pública e manutenção em website público para contratos relativos a direitos reais sobre imóveis; 5) impossibilidade de dívidas do contratado onerarem ou restringirem a regularização e o uso das obras e das edificações, inclusive perante o registro de imóveis, salvo nas contratações de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra; e 6) prazo de garantia e responsabilidade por vícios, defeitos ou incorreções nos casos de construção, reforma, recuperação ou ampliação do imóvel.

ITBI

O STF aprovou a tese decorrente do Tema 1.124, com repercussão geral, pelo qual o fato gerador do ITBI "somente ocorre com a efetiva transferência da propriedade imobiliária, que se dá mediante o registro".

SUPERENDIVIDAMENTO

Entrou em vigor a Lei nº 14.181/2021, que alterou o Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto do Idoso, disciplinando o crédito ao consumidor e dispondo sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento, com aumento da lista de nulidades em contratos firmados com fornecedores. Agora, a concessão de crédito deve ser precedida de exame da condição financeira do consumidor, para não estimular o endividamento imprudente do devedor. Por outro lado, o consumidor tem o dever de não assumir dívidas que comprometam sua capacidade de pagamento. A lei impacta o mercado imobiliário e torna necessária a revisão das minutas dos empreendimentos.

APPs URBANAS

O STJ julgou o Tema Repetitivo 1010, que se aplica a áreas de preservação permanente de cursos d'água em área urbana consolidada, e no qual se decidiu, sem modulação, que na vigência do novo Código Florestal, ou seja, devem ser respeitados os afastamentos de áreas não edificáveis previstos na lei. Isso gerou insegurança jurídica, especialmente para empreendimentos construídos a partir de 2012, quando a lei entrou em vigor, que em tese podem ter suas licenças ameaçadas. Felizmente o Congresso Nacional aprovou o PL 2.510/2019, sem as emendas apresentadas pelo Senado Federal, que inclui no Código Florestal o conceito de áreas urbanas consolidadas, e outorgando aos planos diretores ou lei municipais de uso do solo a definição das APPs de curso d'água conforme critérios locais, mediante estudo socioambiental. Fica ainda autorizada, mediante compensação ambiental, a regularização das construções situadas nas faixas marginais de cursos d'água realizadas até abril. O projeto segue para sanção presidencial.

*André Abelha é advogado especializado em Direito Imobiliário
 Sócio do escritório Longo Abelha Advogados

SUSPENSÃO DOS DESPEJOS e OUTRAS ALTERAÇÕES TEMPORÁRIAS E RESTRITIVAS, ATÉ 31 DE DEZEMBRO/2021, NAS LOCAÇÕES DE IMÓVEIS

Foi promulgada a Lei nº 14.216, em 07 de Outubro de 2021, que estabelece medidas excepcionais em razão da denominada “Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional” - ESPIN, decorrente da Pandemia pelo Coronavírus/COVID-19.

A lei pretende evitar a transmissão do vírus mediante a suspensão temporária, até 31 de Dezembro de 2021, das ordens de desocupação/remoção ou despejo, de maneira que as pessoas que seriam desalijadas da sua atual moradia não fiquem ao relento e abandonadas, podendo talvez até serem infectadas pelo Coronavírus/COVID-19.

Porém, a Lei nº 14.216/2021 não impede o cumprimento de todas as ordens de desocupação/remoção ou despejo!

A lei estipula a suspensão, até 31 de dezembro de 2021, apenas para os seguintes casos específicos:

1) desocupação ou remoção de pessoas que coletivamente tenham invadido e estejam ocupando imóvel urbano, privado ou público, desde que este mesmo imóvel esteja servindo de moradia ou que represente alguma produtividade pelo trabalho individual ou familiar.

2) despejo nas locações de imóveis urbanos, desde que o inquilino comprove que ocorreu alteração da sua situação econômico-financeira, em decorrência de medida de enfrentamento da Pandemia pelo Coronavírus/COVID-19, que tenha resultado em incapacidade de pagamento do aluguel e dos encargos locatícios, impactando na subsistência familiar, mesmo assim apenas quando os aluguéis estiverem limitados aos valores:

A) R$600,00 (seiscentos reais), em caso de locação de imóvel residencial.

B) R$1.200,00 (mil e duzentos reais), em caso de locação de imóvel não residencial.

Então, observa-se que a suspensão das ordens de despejo, nas locações de imóveis urbanos, está sendo direcionada somente para contratos que estipulem valores de aluguéis “populares”.

E ainda existem outros limitadores e requisitos, previstos na mesma Lei nº 14.216/2021, para impedir o cumprimento de uma ordem de despejo na locação de imóvel urbano. A suspensão só pode ocorrer quando a respectiva Ação Despejo tenha sido proposta requerendo uma Medida Liminar que esteja prevista nos incisos I, II, V, VII, VIII e IX do § 1º do art. 59 da Lei nº 8.245/1991.

Portanto, o despejo deve ter origem numa demanda que foi proposta especificamente pelos seguintes fundamentos:

Inciso I do § 1º do art. 59 = “o descumprimento do mútuo acordo (art. 9º, inciso I), celebrado por escrito e assinado pelas partes e por duas testemunhas, no qual tenha sido ajustado o prazo mínimo de seis meses para desocupação, contado da assinatura do instrumento”.

Inciso II do § 1º do art. 59 = “o disposto no inciso II do art. 47, havendo prova escrita da rescisão do contrato de trabalho ou sendo ela demonstrada em audiência prévia”.

Inciso V do § 1º do art. 59 = “a permanência do sublocatário no imóvel, extinta a locação, celebrada com o locatário”.

Inciso VII do § 1º do art. 59 = “o término do prazo notificatório previsto no parágrafo único do art. 40, sem apresentação de nova garantia apta a manter a segurança inaugural do contrato”.

Inciso VIII do § 1º do art. 59 = “o término do prazo da locação não residencial, tendo sido proposta a ação em até 30 (trinta) dias do termo ou do cumprimento de notificação comunicando o intento de retomada”.

Inciso IX do § 1º do art. 59 = “a falta de pagamento de aluguel e acessórios da locação no vencimento, estando o contrato desprovido de qualquer das garantias previstas no art. 37, por não ter sido contratada ou em caso de extinção ou pedido de exoneração dela, independentemente de motivo”.

Logo, os despejos estão suspensos, até 31 de dezembro de 2021, dependendo da configuração de situações específicas, sendo equivocada qualquer notícia ou informação que “os despejos estão proibidos”.

De toda forma, também deve ser observado que a mesma Lei nº 14.216/2021 também estabelece duas outras regras que podem impactar nas locações de imóveis urbanos:

1 - É autorizado que o inquilino faça a devolução do imóvel, independentemente do pagamento de Multa Rescisória (nos contratos que estejam vigorando por prazo determinado) ou independentemente do cumprimento do Aviso 30 dias (nos contratos que estejam vigorando por prazo indeterminado), quando tiver sido frustrada uma tentativa de acordo para desconto, suspensão ou adiamento, total ou parcial, do pagamento de aluguel, e desde que:

A) NAS LOCAÇÕES DE IMÓVEIS RESIDENCIAIS = o inquilino tenha sido impactado, em decorrência da Pandemia pelo Coronavírus/COVID-19, na sua subsistência familiar, por alteração na sua situação econômico-financeira por demissão, redução de sua carga horária ou diminuição de sua remuneração, que resulte em incapacidade de cumprimento das obrigações locatícias.

B) NAS LOCAÇÕES DE IMÓVEIS NÃO RESIDENCIAIS = o inquilino desempenhe uma atividade que tenha sofrido a interrupção contínua, pelo prazo de 30 dias, em razão da imposição de medidas de isolamento ou de quarentena.

OBSERVAÇÃO = a possibilidade de devolução do imóvel, pelo inquilino, independentemente do pagamento de Multa Rescisória ou do cumprimento do Aviso 30 dias, não pode ser aplicada na hipótese que o proprietário do imóvel possua apenas um imóvel alugado e a sua fonte de sustento é a renda correspondente ao aluguel.

2 - É admitido que, durante Pandemia pelo Coronavírus/COVID-19, as tentativas de acordo entre inquilinos e proprietários de imóveis possam ser comprovadas utilizando correspondências eletrônicas ou aplicativos de mensagens.

Concluindo, a Lei nº 14.216/2021 realmente estipula condições excepcionais que podem ocorrer, eventualmente, até 31 de dezembro de 2021; porém, as restrições aplicam-se apenas para algumas locações de imóveis urbanos que atendam aos critérios específicos previstos na própria lei. O propósito legislativo é mesmo enfrentar um período adverso decorrente da Pandemia pelo Coronavírus/COVID-19, sendo interessante observar que a lei está prevendo uma tendência de retorno a normalidade a partir de 1º de janeiro de 2022.

Direito de Preferência não é absoluto para evitar Ação de Despejo


No julgamento do REsp 1193992, o Superior Tribunal de Justiça - STJ definiu que o Locador, quando oferece o Direito de Preferência ao Locatário, não está obrigado a realizar efetivamente o negócio, podendo desistir da alienação de seu imóvel. 

O caso é interessante porque foi proposta uma Ação de Despejo, mesmo estando pendentes definições, entre Locador e Locatário, sobre o Direito de Preferência e a negociação da compra e venda do imóvel.

Em resumo, o que aconteceu foi que o Locador ofereceu o Direito de Preferência ao Locatário, ofertando o imóvel por R$240.000,00. Então, o Locatário ficou interessado em adquirir o imóvel e aceitou a proposta feita pelo Locador. Porém, tudo indica que ocorreu algum conflito sobre o preço do imóvel, sendo que o Locador desistiu de concluir a negociação de compra e venda, preferindo ajuizar uma Ação de Despejo contra o Locatário, alegando-se que o prazo contratual estava vencido e requerendo o despejo.

Na sentença, o Juiz decretou o despejo, fixando o prazo de 15 dias para desocupação. Não satisfeito diante da iminência do despejo, o Locatário interpôs um recurso e o TJMG resolveu reformar a sentença, julgando improcedente o despejo. Contudo, o Locador interpôs recurso ao Superior Tribunal de Justiça - STJ, que, numa reviravolta, resolveu restabelecer a sentença proferida pelo Juiz.

O entendimento que prevaleceu no STJ foi que é irrelevante, na Ação de Despejo, o arrependimento do Locador em realizar o negócio, cabendo ao Locatário apenas tentar uma indenização, num processo autônomo, pelos danos e pelos lucros cessantes (art. 29 da Lei do Inquilinato).

A decisão do STJ enfatiza também que, quando é oferecido o Direito de Preferência, a Lei do Inquilinato “não conferiu ao locatário o poder de compelir o locador” para que efetivamente realize a alienação do imóvel, sendo possível, portanto, desistir da compra e venda, optando-se pela rescisão do vínculo locatício e pelo despejo.

FERNANDO JÚNIOR (Fernando de Magalhães Jr.)
Advogado, Corretor de Imóveis, Professor e Palestrante
Especialista na Lei do Inquilinato
Membro do IBRADIM e Conselheiro Consultivo da AMADI


DICAS DE NEGOCIAÇÃO EM CONTRATOS DE LOCAÇÃO DE IMÓVEIS DURANTE A PANDEMIA DO CORONAVÍRUS - COVID-19



A pandemia do Coronavírus - COVID-19 e seus impactos financeiros estão gerando diversas expectativas sobre a possibilidade de obter revisões de condições contratuais. Evidentemente, as partes contratantes não poderiam supor que ocorreriam limitações e restrições, impostas por intervenção estatal, ao desempenho de diversas atividades empresarias, que repercutem no ritmo da economia brasileira, de maneira que, em quase todos os contratos de locação de imóveis, não foram previstas e estipuladas cláusulas para definição das repercussões dessa calamidade no vínculo contratual.

Os contratos de locações de imóveis caracterizam-se, dentre outros aspectos, pela bilateralidade e pela imposição de prestações continuadas e periódicas no decorrer do tempo. O locador compromete-se em disponibilizar o uso (a posse) do imóvel para o locatário, que assume, em contrapartida, o compromisso de efetuar periodicamente o pagamento de uma retribuição (o preço/aluguel). Porém, durante o período de tempo que foi estipulado para duração da locação do imóvel (o prazo contratual), podem ocorrer situações excepcionais e imprevisíveis, ocasionando em eventual desequilíbrio para continuidade do cumprimento das condições que haviam sido combinadas entre locador e locatário.

Então, nesse cenário de imprevisibilidade e desequilíbrio, que modificaram as circunstâncias que foram consideradas pelas partes contratantes na época da contratação da locação do imóvel, a legislação admite que, em cada caso específico, ocorram revisões ou até mesmo a rescisão do vínculo contratual.

É importante esclarecer que a regra geral determinada pela legislação brasileira é uma imposição de obediência fiel às condições contratadas; porém, a mesma legislação foi inteligente em estipular uma regra de exceção, viabilizando revisões ou rescisões contratuais, desde que rigorosamente constatados requisitos essenciais que justificam e configuram a imprevisibilidade e o desequilíbrio, resultando em onerosidade excessiva para uma parte contratante e, ao mesmo tempo, em vantagem exagerada para a outra parte contratante.

Afinal, a vida é mesmo imprevisível, podendo acontecer desastres e catástrofes inconcebíveis, sendo necessário, então, tentar reequilibrar e equalizar as condições contratuais que foram previstas para períodos de normalidade.

Portanto, conclui-se que:

É possível tentar negociar alterações nas cláusulas contratuais, notadamente sobre condições de pagamento de aluguéis, em virtude da pandemia do Coronavírus - COVID-19 e das suas repercussões financeiras? SIM.

Essas alterações nas cláusulas contratuais são obrigatórias e impositivas para todos os contratos de locação de imóveis? NÃO.

Diante do exposto, elaborei algumas orientações que podem ser utilizadas nas negociações em locações de imóveis nessa época emergencial de crise do Coronavírus - COVID-19.

  • Atender gentilmente todas as solicitações que sejam encaminhadas por locadores ou locatários, colocando-se disponível para auxiliar na busca de manutenção do equilíbrio contratual. 
    OBJETIVO = retenção do vínculo contratual.
  • Utilizar as informações já disponíveis nos seus arquivos sobre o perfil econômico, patrimonial e financeiro dos contratantes (locadores e locatários), empreendendo esforços para conseguir uma atualização destas informações e, especialmente, diligenciar para obter provas suficientes sobre as alegações utilizadas pela parte contratante que esteja pleiteando a revisão contratual (por exemplo: solicitar documentos ou provas satisfatórias, ao inquilino que esteja solicitando a isenção do pagamento do aluguel, sobre os impactos financeiros gerados pelo impedimento, por ato governamental, para o exercício de sua atividade empresarial).
  • Examinar criteriosamente cada caso concreto, individualizando a situação pessoal do locador e do locatário, avaliando de forma minuciosa a documentação que comprove as alegadas repercussões financeiras ocasionadas pela crise do Coronavírus - COVID-19, visando identificar no caso específico que realmente teria ocorrido alguma onerosidade excessiva para uma parte contratante e, ao mesmo tempo, uma vantagem exagerada para a outra parte contratante.
  • Negociar e indicar a resolução adequada para reequilíbrio contratual, mediante algum tipo de flexibilização das condições originalmente contratadas, sendo que esta flexibilização só deve ser recomendada quando for constatado um efetivo desequilíbrio entre a onerosidade das obrigações e as vantagens decorrentes dos compromissos bilaterais assumidos pelas partes contratantes na época da contratação da locação do imóvel.
  • Estimular a verificação, em cada caso específico, que os reflexos da pandemia do Coronavírus - COVID-19 certamente repercutem em instabilidade financeira para ambas as partes contratantes, não sendo razoável, nesse momento angustiante, uma automática isenção do cumprimento das obrigações locatícias, sendo talvez plausível, então, conceder somente um diferimento (adiamento) ao locatário para pagamento do aluguel, mesmo assim dependendo da existência, por parte do locador, de alguma poupança/reserva de capital. Desta forma, ambas as partes contratantes podem tentar auxiliar-se mutuamente para terem algum fôlego para enfrentamento desse período de crise.
  • Elaborar um relatório do caso e, especialmente, formalizar um acordo contendo as condições que eventualmente venham a ser negociadas e pactuadas entre as partes contratantes. 
    DICA ESPECIAL = neste acordo deve constar uma cláusula mencionando que a revisão contratual foi ocasionada pelos efeitos da pandemia do Coronavírus - COVID-19, de maneira que reflete uma situação excepcional e que, a qualquer momento, pode ocorrer renegociação ou até mesmo cancelamento das condições pactuadas, dependendo da modificação do panorama atual de contenção das atividades empresariais e de isolamento das pessoas. É interessante constar também que as partes contratantes comprometem-se solenemente a proceder uma revisão do acordo na hipótese de alteração da situação atual relacionada à pandemia do Coronavírus - COVID-19, sendo que, no caso de resistência injustificada de uma parte contratante na construção de outro diálogo para enfrentamento da necessidade de revisão do acordo, a outra parte contratante pode cancelar o acordo mediante notificação.
Essas dicas obviamente não pretendem exaurir todas as abordagens a serem adotadas em cada caso específico, sendo aconselhável que sempre sejam utilizadas técnicas criativas de conciliação e mediação, nunca desmerecendo o critério da razoabilidade.
O importante é obter performance nas negociações e atender ambas as partes contratantes!

FERNANDO JÚNIOR (Fernando de Magalhães Júnior)
Advogado, Professor e Palestrante, especialista na Lei do Inquilinato
Membro do IBRADIM e Conselheiro Consultivo da AMADI

O IMPACTO DA PANDEMIA DO CORONAVÍRUS - COVID-19 NA ADMINISTRAÇÃO DE LOCAÇÕES DE IMÓVEIS - PROBLEMAS - SOLUÇÕES - A TEORIA DA IMPREVISÃO E O DESEQUILÍBRIO CONTRATUAL